Há um tempo...



Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.


Fernando Pessoa

Caminhos da Vida

[rosa+no+chão.jpg]




Se não puder fazer do caminho do seu semelhante um jardim florido, pelo menos, não semeie espinhos, você, certamente, retornará por ele.

Soélis Sanches


Sempre...


[intheoceanspreadingarmswideopen.jpg]
Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final...
Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver.
Encerrando ciclos, fechando portas, terminando capítulos. 
Não importa o nome que damos, o que importa é deixar no passado os momentos da vida que já se acabaram.
Foi despedida do trabalho? Terminou uma relação? Deixou a casa dos pais? Partiu para viver em outro país? A amizade tão longamente cultivada desapareceu sem explicações? Você pode passar muito tempo se perguntando por que isso aconteceu...
Pode dizer para si mesmo que não dará mais um passo enquanto não entender as razões que levaram certas coisas, que eram tão importantes e sólidas em sua vida, serem subitamente transformadas em pó. Mas tal atitude será um desgaste imenso para todos: seus pais, seus amigos, seus filhos, seus irmãos, todos estarão encerrando capítulos, virando a folha, seguindo adiante, e todos sofrerão ao ver que você está parado.
Ninguém pode estar ao mesmo tempo no presente e no passado, nem mesmo quando tentamos entender as coisas que acontecem connosco.
O que passou não voltará: não podemos ser eternamente meninos, adolescentes tardios, filhos que se sentem culpados ou rancorosos com os pais, amantes que revivem noite e dia uma ligação com quem já foi embora e não tem a menor intenção de voltar.
As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas realmente possam ir embora...
Por isso é tão importante (por mais doloroso que seja!) destruir recordações, mudar de casa, dar muitas coisas para orfanatos, vender ou doar os livros que tem.
Tudo neste mundo visível é uma manifestação do mundo invisível, do que está acontecendo em nosso coração... e o desfazer-se de certas lembranças significa também abrir espaço para que outras tomem o seu lugar.
Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se.
Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos.
Não espere que devolvam algo, não espere que reconheçam seu esforço, que descubram seu génio, que entendam seu amor. Pare de ligar sua televisão emocional e assistir sempre ao mesmo programa, que mostra como você sofreu com determinada perda: isso o estará apenas envenenando, e nada mais.
Não há nada mais perigoso que rompimentos amorosos que não são aceitos, promessas de emprego que não têm data marcada para começar, decisões que sempre são adiadas em nome do "momento ideal".
Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará!
Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo, sem aquela pessoa - nada é insubstituível, um hábito não é uma necessidade.
Pode parecer óbvio, pode mesmo ser difícil, mas é muito importante.
Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida.
Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é. Torna-te uma pessoa melhor e assegura-te de que sabes bem quem és tu próprio, antes de conheceres alguém e de esperares que ele veja quem tu és…
E lembra-te:

Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão...
Fernando Pessoa

Utopia




Why does it rain, rain, rain down on utopia?
Why does it have to kill the ideal of who we are?
Why does it rain, rain, rain down on utopia?
How will the lights die down telling us who we are

Pensei em ti na noite passada

...
Pensei em ti na noite passada. A lua estava igual ás outras noites, não estava nem mais escuro nem mais frio que nas outras noites. O ritual foi o mesmo, o céu encheu-se de estrelas como sempre e eu deixei-me levar pela noite. Não parei um segundo sequer, mas nem foi preciso. Não me saíste nunca da cabeça.
Então, sem me dar conta, pensei em ti. Não sabia onde estavas. Não sei o que fazes quando o sol se vai nem o que dizes. Não ouço as tuas palavras e não sinto o teu perfume. Não ouço os teus passos, não consigo sentir as tuas mãos perto de mim e nem corro o risco de ser abraçada pelos teus braços. Estás tão longe!
Doeram-me os músculos e pesaram-me os olhos de saber que estás longe. Falei contigo mas não me ouviste. Os pulmões enchiam-se de ar e eu não respirava. Onde estavas tu? Aventurei-me a imaginar-te a fazer algo banal. A ouvir música, a olhar para o céu e a pensar em mim [porque não? nos meus pensamentos mando eu!]. Tentei-me lembrar do contorno dos teus olhos e apercebi-me que jamais em todos estes anos estive perto o suficiente para os saber de cor.
Quase que toquei o teu cabelo novo e consegui ver nitidamente as tuas mãos. Mas onde andavam os teus olhos? Não me consigo ainda lembrar da cor deles. Alguma vez olharam eles para mim?
Ontem olharam. E ontem, pensei em ti. Toda a minha realidade de abstraiu da verdade e por momentos não estavas assim tão longe. E eu estava perto. Segui os teus passos e tentei deduzir onde eles te levavam, vi o movimento das tuas mãos. Falavas, mas eu continuava sem ouvir o que dizias. Apenas os teus lábios se mexiam sem parar. Toquei sem sentir o casaco de fecho que usavas e vi recortes de notícias nas paredes. Soltei-te as amarras e guardei-te comigo. Guardei a tua imagem, a tua presença numa fotografia intemporal. [gosto de pensar que posso roubar um pedaço de ti, e que tu estás tão distraído que nem reparas].
Ontem foste meu. Foi o meu pensamento, o meu sonho, as minhas memórias de um "tu" que não existiu nunca. O teu olhar perseguiu cada movimento meu. Os teus olhos não desprenderam dos meus. Não estiveste longe e eu estava contigo.
Ontem, as nuvens acabaram por descobrir a lua e eu já não estava mais perto e tu voltaste a estar longe. Os teus olhos voltaram a estar vazios e eu voltei a não pensar em ti.
...



Início...







 "O início de um hábito é como um fio invisível, mas a cada vez que o repetimos o ato reforça o fio, acrescenta-lhe outro filamento, até que se torna um enorme cabo, e nos prende de forma irremediável, no pensamento e acção".

 
Orison Swett Marden